light gazing, ışığa bakmak

Thursday, November 1, 2007

Idades Cidades Divindades, de Mia Couto

Devo ter andado muito distraída: o novo livro de poesia de Mia Couto saiu no último dia de Setembro e só antes de ontem o comprei, ansiosamente. Não resisti e fui lendo logo pela rua.

Apenas o segundo livro de poesia deste autor, editado pela Caminho. Tal como a Grace e a Sombra, resta-me passar a palavra ao escritor e exortar à compra do livro. Achei a escrita limpa, quase anedota, por vezes, canção de ainda protesto, outras. Um poeta que se adivinha calmo, por um lado, e extremamente preocupado com o tempo que passa, por outro.

O outro idioma
Inquirido
sobre a sua fluência
em português, respondeu:

- Tenho duas línguas:
uma para mentir,

outra para ser enganado.
A professora
ainda perguntou:
- E qual delas é o português?

- Já não me lembro, respondeu.

--

O Piso e o Passo
Envelheço como o sapato:
quanto menos sirvo
menos aleijo o chão.

Antes,
eu buscava
conhecer um lugar.

Agora,
apenas quero
um lugar
que me conheça.

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Desleitos

Recuso o leito.
Quero dormir
onde não tenha cabimento.

O problema da cama
é que, tal como no caixão,
ganhamos o tamanho da tábua.

Para sonhar,
prefiro o inteiro chão.

Tenho a sede
do embondeiro:
Ao invés de beber,
Eu engulo o chão inteiro.

---

(a pedido)

Mulher

Solteira, chorei.

Casada, já nem lágrima tive.

Viúva, perdi olhos
para tristezas.

O destino da mulher
é esquecer-se de ser.


3 comments:

jorge vicente said...

muito bom mesmo.

um grande beijinho
jorge

Unknown said...

Procuro o poema "mulher" deste livro, podias publicá-la? Muito obrigada

Ana V. said...

Agata, por este pedido já dei 3 voltas à casa e a todas as prateleiras, já cheguei à conclusão que preciso de arrumar os livros, já tirei uns 3 da prateleira para "ler a seguir" e não encontrei! Mas não faz mal: amanhã sem falta ponho aqui o poema. :)

 
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